Conto

Humor – Fantasia

A segunda Provação de Jó

Pastor Antônio enfrenta desafios ao assumir sua missão em Minas Gerais, em um conto de humor e fantasia repleto de provações e mistérios.

José Antônio enxugou o suor e suspirou diante do prédio da Igreja Metodista encravado no topo da colina. Ele sabia que aceitar a designação de Pastor implicava em enfrentar desafios, e como sempre acontece com os novatos, a direção da organização decidiu que seu ministério começaria numa pequena cidade do interior. Seu destino? Arraial do Bom Jesus de Minas. Paulista de nascimento, o jovem abraçara a fé ainda na adolescência e decidiu que dedicaria o vigor da sua juventude à propagação da Palavra.

O primeiro culto que dirigiu na cidade não foi lá essas coisas; Antônio achou que em alguns momentos a assistência sentiu-se meio perdida em suas explicações um tanto empoladas de palavras da norma culta da língua portuguesa. A prova disso foi que logo ao encerrar a reunião, diversas pessoas vieram lhe perguntar o significado de muitas palavras. Por um lado isso era bom, pois mostrava que sua assistência estava atenta, no entanto, havia o sempre presente risco de alguém dar uma má interpretação ao que dissera e fazer uma aplicação errônea do seu sermão.

Antônio lembrou-se, então, do que lhe dissera Oscar Diniz, um velho pastor do corpo docente, ao saber que ele iria para Minas Gerais:

— Jamais recuse um cafezinho com um pedacinho de queijo mineiro quando estiver fazendo visitas aos membros; os mineiros tem um jeito peculiar de falar e você deve entendê-los, mas não tente imitar o jeito deles falarem; saiba que a palavra “trem” significa qualquer coisa, inclusive trem, mas principalmente, os mineiros têm muito mais facilidade para entender e aceitar as coisas quando você inclui a rotina e os costumes de Minas Gerais na conversa!

O tema que escolheu para o culto deste domingo versava sobre manter-se fiel sob quaisquer circunstâncias e estar atento às maquinações do inimigo, e segundo sua maneira de pensar, Jó era o melhor exemplo disso! Disposto a se fazer entender, Antônio abriu a Bíblia e começou a estruturar o seu discurso. Duas horas depois, cansado, ele deu um sorriso ao contemplar o rascunho, mas se Deus quiser (e ele haveria de querer), dessa vez as pessoas entenderiam o que ele falava.

*****

Antônio respirou fundo e encarou a sua assistência, que neste dia beirava sessenta pessoas:

— Bem, meus irmãos, hoje falaremos sobre Jó. Todos sabem que Jó sofreu na carne e no espírito as consequências da sua provação. Nem preciso dizer que ele perdeu tudo o que tinha, inclusive os filhos, mas ainda assim ele manteve-se fiel. Mas há duas coisas que vocês não sabem, e é claro que não há como saber, pois não está na Bíblia, entretanto, hoje vou compartilhar esse mistério com vocês!

O pastor colocou a mão na boca como se estivesse contando um segredo e sussurrou ao microfone:

— Jó era mineiro, trabalhava em uma fazenda e teve de enfrentar uma segunda provação!

Quietude total no interior do templo por incontáveis segundos. O filho da irmã Celinha, uma criança de colo, soltou um “pum”, que devido ao silêncio, ecoou pelo interior da igreja como um trovão.

— Vejo que vocês não conhecem a história, então vou explicar. Jó não só era muito fiel a Deus, mas era também um homem muito esperto. Quando terminou a sua provação, Deus decidiu recompensá-lo em dobro com tudo o que possuía anteriormente,

e quando o Todo Poderoso se preparava para recompensar o seu fiel servo, quem surge novamente diante do Nosso Pai? Ele mesmo! O caluniador máximo, dizendo:

“Espere aí que ainda não acabou! Eu ainda posso fazê-lo pecar contra Ti!”

“Mas de novo essa história? Chega! Aquele pobre homem já sofreu demais por conta dessa sua implicância”, Deus respondeu.

“Mas quem disse que vou causar sofrimento? Pelo contrário, agora vou fazer com que ele troque a devoção a Ti pelo regalo, pela prosperidade e pelo dinheiro! Vai permitir que eu faça isso ou tem medo de que seu protegido se mostre desleal?”

“Aiaiai, você não desiste, não é? Está bem, pode tentá-lo, mas nada de causar mais sofrimento, ouviu bem? Você está proibido de tirar um grão de trigo dele!”

“Tirar o quê? Aquele infeliz já perdeu tudo! Só quero fazer com que ele recupere tudo a um certo preço”, o Inimigo riu. “Vou começar agora mesmo”.

Deus ordenou ao anjo Gabriel:

“Acompanhe esse pulha; se ele faltar com a palavra, use a espada flamejante”.

Vendo que a assistência estava atenta, Antônio prosseguiu:

— E assim aconteceu. O Tinhoso e o anjo Gabriel saíram da presença do Senhor e vieram diretamente à Terra. Mas quem era Jó? Um homem comum? Não mesmo! Além de fiel a Deus, Jó era conhecido pela inteligência e sagacidade muito além do normal. Não havia quem o vencesse na proposição e solução de charadas, e não foram poucas as vezes que seus amigos e compadres buscaram seu conselho antes de fechar um negócio, sendo que em algumas ocasiões, Jó conseguiu “pegar no pulo” o gaiato que tentava passar seus conhecidos para trás.

— Recuperado da doença e da morte dos filhos, Jó fazia o possível para recomeçar e levava uma vida simples e relativamente feliz. No entanto, mesmo quando ainda era rico, Jó tinha um grande problema. Por mais que se esforçasse, nunca aprendeu a ler. Durante a infância e adolescência, de nada adiantou a paciência quase infinita da carinhosa mestra Odete ou os doloridos puxões de orelha de sua outra professora, a brava e quase feroz Dona Elza; não havia ser humano na face da terra que o fizesse decorar as letras. “O que não tem remédio, remediado está”, dizia ele, referindo-se à pobreza e ao analfabetismo. Jó tinha quatro grandes paixões: sua esposa Rosalinda, a pinguinha no bar do Zé Grande, o jogo de truco e uma velha garrucha da qual não saía de casa sem ela. Tamanho era seu apego à arma deu à ela o nome de Genoveva.

“Meu amigo, você não pode se conformar com isso”, disse o compadre Onofre, enquanto os dois estavam à espreita na várzea caçando capivaras. “Um homem inteligente como você precisa saber ler! Por que não volta à escola, homem de Deus? Dizem que a nova professora do grupo escolar é muito boa”.

“Carece não, cumpadi”, Jó respondeu. “Burro véio num péga arreio!”

O pastor continuou com a história:

— E a vida seguia seu rumo cadenciado e pachorrento naquelas paragens do sertão. Opa, mas eu disse que “não havia ser humano na face da terra que o fizesse decorar as letras”, mas alguém de fora do plano terrestre vinha acompanhando com interesse a odisseia de Jó, estão lembrados? Sim, ele mesmo, também conhecido como Tinhoso, Coisa Ruim, Capiroto! Assim, numa tardezinha, Jó voltava para casa após ficar um bom tempo jogando um carteado e tomando umas pingas no Zé Grande. Ao passar pela encruzilhada da Capela Velha, eis que ele dá de cara com dois cavalheiros muito bem vestidos, embora um deles fedesse a enxofre, e este perguntou:

“Estou tendo o prazer de falar com o senhor Jó?”

“Eu mermo, seu criado”, respondeu, erguendo o chapéu. “Qual é sua graça?”

“Sou alguém que pode realizar seus dois maiores desejos”, respondeu o homem, esquivando-se de dizer o próprio nome. “Posso fazer de você um homem muito rico novamente e o que é melhor, fazer você aprender a ler assim…”

O estranho estalou os dedos enquanto falava.

“Ora, mas isso seria bão dimais da conta, uai. E o qui eu tenho di fazê?”

“Que esperto, o quê! Esse já está no papo”, pensou o Inimigo.

“Você só precisa assinar esse contrato e pronto! Você será um homem rico e aprenderá a ler da noite para o dia”, o homem retirou uma folha do bolso do paletó enquanto o outro distinto cavalheiro apenas observava.

“Uai, mas como qui eu vô assiná si eu num sei lê nem iscrivinhá?”

“Hum, mais esperto do que pensei”.

Antônio disse:

— E então, meus irmãos, esse estranho homem estalou os dedos e disse:

“Olhe de novo!”

Jó olhou o papel e para sua surpresa, conseguiu ler a folha, que trazia no topo a palavra CONTRATO em letras garrafais, e logo abaixo vinha o texto “Eu, Jó, em pleno gozo de minhas faculdades mentais, concordo em vender a minha alma ao Diabo, desde que o mesmo me torne rico e alfabetizado…”

O estranho estalou os dedos novamente e Jó não pôde continuar lendo. Voltara a ser analfabeto!

“Mas purcausdiquê que ocê feiz isso, sô? Dêxa eu lê os trem, uai!”

“Temos um acordo? Te dou riquezas e leitura se me vender sua alma.”

“Minha arma? Ocê tá dizeno que qué minha arma pra mi torná um hôme rico e conhecedô das letra?”

“Sim, isso mesmo, só quero a sua alma!”

“Óia, só vendo minha arma procê si ocê realmente fizé di mim um hôme rico e letrado, sinão, néca di catibiriba! Vamo fazê o siguinte: eu vô pra casa e vô drumi. Si amanhã eu acordá rico e sabedô das letra, eu mermo vô iscrivinhá o contrato vendendo minha arma procê. Si quisé ansim, bem; si num quisé, amém!”

“Por mim está ótimo”, disse o Tinhoso, “amanhã à noite vou te esperar aqui. Ao nascer do sol você já será rico e alfabetizado. Escreva o contrato e traga-o redigido e assinado. Amanhã, antes do anoitecer, você estará nadando em dinheiro e lendo como um catedrático.”

“Catê o quê?”

“Deixa pra lá, mas não vá recuar no acordo, hem? Trato é trato!”

“Sim, mas ocê tamém vai cumprir, num é? Vê si num dá pra trás!”

O anjo Gabriel encarou o Tentador.

“Mais é claro! Palavra empenhada é palavra dada! Vale o que está escrito!”

“Pois entonces ocê num percisa se peorcupá que sô um hôme di palavra! Concordo cum ocê; vale o que está iscrito!”

“Está combinado! Vou deixar você desfrutar de sua nova vida por cinco anos, e ao final destes, virei reclamar sua alma!”

“Pur mim tá ótimo! Dispois de cinco ano minha arma será sua.”

O Tentador encarou Gabriel, sorriu e disse:

“Mais fácil do que pensei!”

“Vá com calma, meu irmão rebelde”, o anjo advertiu.

“Com calma? Você mesmo viu! O seu fiel Jó acabou de me vender a alma em troca de riquezas!”

Antônio completou à sua atenta assistência:

— E assim, queridos irmãos, os dois desapareceram no ar, convencendo Jó de falara com o Tinhoso em pessoa. Ele deu de ombros e foi para sua casa dormir. No dia seguinte, ele acordou sentindo-se um pouco estranho, e ao dirigir-se à cozinha para tomar um café, surpreendeu-se ao ler “FEIJÃO” no pote de plástico onde Rosalinda guardava o citado mantimento. Ao lado, um pote ostentava a palavra “ARROZ”; em uma lata nas cores verde e branca, ao lado do fogão a lenha, estava escrito “SAL”.

“Óia só, num é que tô lendo mermo? Rosalinda, acorda, muié!”

“O que foi, hôme? Que disassossego é esse?”

“Minha frô, eu to leno! Aprendi a lê!”

“Mais ansim, sem mai nem mêno?”

“Sim, que coisa mais que mió di bão, né não?”

“Ó de casa”, gritou alguém do lado de fora.

O casal saiu e deu de cara com João Brito, que trabalhava no cartório, que já tinha apeado e remexia uma bolsa de couro, de onde retirou alguns papéis.

“Parabéns, Jó, o senhor é o mais novo rico do arraial!”

“Como ansim?”

“O senhor é o único herdeiro do coronel Monteiro, que faleceu ontem à noite. Parece que ele lhe queria muito bem! No testamento, ele disse que ‘deixava todos os bens para o seu empregado Jó, pelos longos anos de boa amizade e inesquecíveis partidas de carteado’. Como o coronel não tinha filhos, o senhor é o dono do casarão, das terras e de uma fortuna gigantesca!”

“Mai num é que o Tinhoso cumpriu com a parte dele? Agora sô rico e letrado”, Jó pensou.

“O senhor só precisa assinar aqui no testamento, confirmando que recebeu os bens, mas, xiii… esqueci que o senhor não sabe ler”

“Pois agora eu sei lê sim sinhô!”

Jó assinou e no mesmo dia ele e Rosalinda se mudaram para o casarão. E como era um homem de palavra, ele redigiu um contrato muito simples em duas vias, onde se lia “CONTRATO. Eu, Jó, garanto que não tô abilolado das ideia e concordo em vendê minha arma pru Diabo se ele fizé di mim um hôme rico e que sabe ler. Si ele fartá com a palavra ou mi matá, esse contrato perde o valô. Se ele fizé tudo certim, tintim por tintim, daqui a cinco ano ele pode vim recramá minha arma.”

— E assim, irmãos, conforme combinado, na hora marcada Jó foi ao local onde firmara o acordo e encontrou os dois homens. O que fedia a enxofre perguntou:

“E então, senhor Jó, está gostando da nova vida?”

“Tô gostando dimais da conta, sô! Essa história di vortá a sê um caipira gordo e rico é tudo que eu sempre quis, uai! E o que é mió; agora eu sei lê!”

“Então aceita o acordo?” — Perguntou o estranho, sorrindo de maneira quase maligna. “Posso ver o contrato que o senhor escreveu?”

“Mas craro que pode! Tá tudo aí, ó; se eu ficá rico e letrado, ocê passa a ser o dono da minha arma!”

O homem examinou o contrato e viu que realmente estava tudo ali. Ele repassou o documento ao seu companheiro, que leu, deu um sorriso e o devolveu, com um aceno de cabeça. O Tinhoso enrolou o papel e colocou-o bolso do paletó. Em seguida, assinou a outra via do contrato e entregou-a a Jó.

“Então, nos vemos em cinco anos”, disse, sumindo no ar como havia feito na noite anterior.

“E agora, Gabriel, onde está o seu fiel Jó? Diga ao nosso Pai o que você acabou de presenciar”, o Cão comemorava, enquanto retornavam ao mundo invisível.

Os fiéis dentro da igreja estavam boquiabertos. Antônio prosseguiu:

— Viram só, irmãos? Foi assim que Jó recuperou a sua fortuna! A Bíblia apenas diz que ele ficou rico novamente e recebeu tudo em dobro, mas não diz como isso aconteceu. Mas voltemos à nossa história! Jó agora lia livros e mais livros, e quanto à sua fortuna, esta continuava a crescer de maneira descomunal. Entretanto, como tudo tem um preço, chegou o momento de quitar sua dívida, de modo que exatamente no dia em que o acordo celebrava seu quinto aniversário, ao nascer do sol, Jó recebeu a visita daqueles dois misteriosos homens novamente.

“Entrem, vamos tomar um café”, Jó convidou.

“Acho melhor pular essa parte e ir direto ao assunto”, o outro respondeu.

“Credo, esse miserento ainda tá fedendo enxofre”, Jó pensou.

“Como o senhor deve saber, hoje é o dia de reclamar meu pagamento”.

“Sim, estou ciente da minha dívida consigo. Tranquilize-se, por favor, e acompanhe-me no desjejum. É extremamente deselegante receber uma visita e não convidá-la ao abrigo de seu teto, e eu deveras sentir-me-ia muito mal em cometer tamanha grosseria e falta de polidez com um convidado, ainda que o convidado seja o próprio Diabo. Venha, às vezes precisamos de um pouco de café para adoçar o sabor amargo dos negócios”.

“Ora, vejo que o senhor fez bom proveito da leitura! Seu vocabulário melhorou muitíssimo.”

“Ah, nada como ver o mundo pelos olhos de homens como Eça de Queiroz, Machado de Assis e Graciliano Ramos. Eu não poderia ter feito uma troca melhor!”

“Também acho”, pensou o Diabo, esfregando as mãos.

“Então, creio que posso levar o que é meu.”

“Perfeitamente! Tem certeza de que não quer entrar?”

“Tenho, sim, estou com pressa.”

“Pois então vamos resolver isso já! Por favor, espere só um pouquinho que vou lá dentro buscá-la”, disse Jó, dando meia volta e entrando na casa.

“Buscar? Como assim? Buscar a alma?”

O Tinhoso olhou Gabriel, que apenas sacudiu os ombros.

O Diabo não estava entendendo nada, mas resolveu “dar corda” e aguardou com interesse. Ele deu um sorriso. Provavelmente Jó faria como tantos antes dele, que tentavam se esconder ou correr para dentro de uma igreja na tentativa de escapar do cumprimento do acordo. Particularmente, era desses que mais gostava, pois os infelizes ainda lhe proporcionavam o prazer de uma pequena caçada. Assim, foi grande a sua surpresa quando alguns minutos depois, Jó voltou todo sorridente, trazendo uma caixa de papelão debaixo do braço.

“Demorou um pouco mais achei. Vou sentir muita falta dela, mas acordo é acordo! Aqui está, pode levar!”

“Levar o quê? O que é isso?”

Perguntou o Diabo, apontando a caixa.

“Isso? Ora essa, a minha parte no acordo.”

O estranho abriu a caixa, de onde retirou a garrucha Genoveva.

“Mas que raio de brincadeira é essa? O que vou fazer com uma garrucha velha? Eu não preciso disso!”

“Mas foi isso que você me pediu; lavramos em contrato!”

“Claro que não!”

“Foi sim. Meu caro Mephistófeles, por favor, leia o contrato; ele também está dentro da caixa. Preste bastante atenção à última linha!”

“O senhor está debochando de mim”, o homem começou a ficar vermelho como o Diabo. Aliás, ele era o Diabo. “Há cinco anos, o senhor não tinha capacidade sequer

de ler uma placa de estação de trem, no entanto, o senhor acabou de citar Goethe! Eu te dei cultura e fortuna, então pare com as gracinhas! Não se esqueça que firmamos um contrato!”

“Mas eu estou cumprindo o contrato. Veja, está escrito ‘se ele fizé tudo certim, tintim por tintim, daqui a cinco ano ele pode vim recramá minha arma’ ”.

“Eu quero é a sua alma, não sua arma, e para que o acordo seja plenamente consumado, e senhor deverá reconhecer que me deve, pois vale…”, o estranho ficou mudo de repente.

“Exatamente! ‘Vale o que está escrito’. São suas palavras, está lembrado? Eu prometi minha arma, estou te dando minha arma. Vai querer a Genoveva ou não? Decida-se logo; eu também não tenho o dia todo!”

O estranho olhou-o de maneira furiosa e gritou:

“Pois vou pegar essa arma e vou enfiá-la no seu…”

Gabriel sacou a espada e encostou-a na garganta de seu companheiro:

“Nosso Pai foi muito claro quando disse que não deveria fazer nenhum mal ao fiel Jó! Você foi vítima de sua própria astúcia, irmão! Como dizem no Rio de Janeiro, perdeu, playboy! E vai cumprir o acordo!”

— E assim, como sempre faziam, os dois sumiram no ar — Antônio finalizou a história. — O que acontece a seguir, todos sabem. A fortuna de Jó foi duplicada, ele teve dez filhos, as filhas dele eram as maiores gatas do Minas Tênis Clube e blá-blá-blá.

O jovem pastor concluiu o sermão destacando a perseverança diante das provações e a importância de manter-se atento diante das tentações, e finalizou destacando a necessidade de vigiar sempre, afinal, nem todos tem a sagacidade de Jó.

A assistência explodiu em estrondosas palmas, uma reação bem diferente do último domingo, quando todos pareciam ter ficado com “cara de caneca”.

O culto terminou e Antônio ainda ficou um tempo conversando com os fiéis, que aos poucos foram tomando seu rumo. Por fim, trancou a porta do templo e dirigiu-se para o conforto do seu lar.

Sentindo a brisa fresca da noite no rosto, meditava na forma como conduzira a palestra e ficou se questionando se não exagerara. Antônio sorriu e sentiu-se com a consciência tranquila. Afinal, o próprio apóstolo Paulo diz que “se fez judeu para os judeus e gentio para os gentios”, ou seja, o importante era transmitir a mensagem de uma forma que seu rebanho pudesse assimilar. Ele exagerara? Um pouco, mas afinal, está escrito que “somos todos loucos de Deus”, e vale o que está escrito!

Escrito por Alexandre Naves

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